Termina na próxima segunda-feira (10) o prazo para envio de propostas de enunciados à I Jornada de Direto Administrativo, que será realizada de 22 a 24 de abril pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF). O coordenador científico do evento, Cesar Augusto Guimarães Pereira, lembra que a participação no encontro pressupõe a formulação de propostas de enunciados para serem submetidas ao debate.
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“Sem ter sido convidado como especialista na matéria ou sem ter apresentado uma proposta para discussão, o eventual interessado não vai ter como participar, porque não há inscrições livres para o público”, afirmou.
Doutor em direito administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e autor das obras Elisão Tributária e Função Administrativa e Usuários de Serviços Públicos, entre outras, Guimarães Pereira é presidente da Câmara de Arbitragem e Mediação da Federação das Indústrias do Estado do Paraná. Nesta entrevista, ele fala sobre os objetivos, as expectativas e os temas da jornada.
Qual é a importância da Jornada de Direito Administrativo no universo jurídico?
Guimarães Pereira – As jornadas em geral – não só esta, do direito administrativo – têm sido muito importantes. Foram criadas em 2002, por iniciativa do ministro Ruy Rosado, no ambiente da edição do novo Código Civil, e já se consolidaram em diversas áreas como um espaço para discussão doutrinária e aprofundamento em questões práticas, com o propósito de formular proposições interpretativas a respeito das normas.
Nesse formato se reúnem especialistas para discutir propostas de interpretação que às vezes consolidam o entendimento já reconhecido acerca do tema, e outas vezes propõem entendimentos novos, mas sempre refletindo um determinado consenso da doutrina. A jornada, de fato, se tornou muito conhecida em diversas áreas. No âmbito do direito civil, já foram realizadas oito jornadas; no direito comercial, foram três, por exemplo.
E agora, finalmente, o Conselho da Justiça Federal decidiu fazer a I Jornada de Direito Administrativo. É muito relevante que esse formato, já consagrado em outras áreas do direito, tenha chegado ao direito administrativo e vá permitir que os principais temas da área sejam tratados nesse mesmo ambiente, de reunião de doutrinadores e especialistas, de discussão intensa e aberta. É uma iniciativa muito meritória do CJF introduzir esse formato de discussão agora no direito público.
Que resultados práticos são esperados desse evento?
Guimarães Pereira – A ideia da jornada é propor, discutir e aprovar enunciados que traduzam um entendimento a respeito das normas jurídicas vigentes. O que se espera é uma discussão ampla a respeito de muitos dos temas relevantes que a doutrina vem debatendo no direito administrativo brasileiro para orientar a jurisprudência e os aplicadores do direito acerca desse entendimento predominante.
Os enunciados produzidos na jornada não se confundem com súmulas dos tribunais superiores e não refletem necessariamente a jurisprudência, mas traduzem o entendimento doutrinário. O que a jornada faz é reunir doutrinadores que pensam de formas distintas, que vão ficar reunidos durante dois dias para chegar a um certo consenso a respeito de determinados temas.
É só imaginar que, em lugar de fazer uma ampla pesquisa a respeito da doutrina produzida por diversos desses grandes administrativistas que vão estar na jornada, um aplicador do direito administrativo pode se valer de um enunciado, que vai traduzir exatamente isso: o fruto do debate desses diversos doutrinadores e o consenso mínimo que vai ter recebido a aprovação de dois terços desse grande número de doutrinadores. Então, é muito significativo que haja a aprovação de enunciados desse tipo e que os aplicadores do direito, depois dessa jornada, possam receber essas proposições de orientação interpretativa como um reflexo do entendimento no direito administrativo brasileiro.
Quais temas foram objeto de mais propostas de enunciados?
Guimarães Pereira – A Jornada de Direito Administrativo é dividida em seis comissões de trabalho. Elas procuram reunir os principais temas em debate hoje em dia no Brasil. Cada comissão dessas tem dois coordenadores científicos e um presidente, que é ministro do Superior Tribunal de Justiça.
Percebemos um fenômeno nesta jornada – que talvez não tenha acontecido da mesma forma em outras áreas –, que foi o surgimento espontâneo, por meio de diversas instituições, em várias cidades, de reuniões preparatórias, em que a comunidade jurídica examinava a temática das comissões e discutia temas que poderiam vir a ser objeto de enunciados. Ficamos muito satisfeitos na coordenação com o surgimento desse tipo de manifestação de interesse. Eu, por exemplo, participei de várias dessas reuniões a convite dos organizadores. Os coordenadores das comissões e outros envolvidos na coordenação também participaram das reuniões preparatórias. Percebemos um interesse muito grande por diversos dos temas.
A campeã de demonstração de interesses até agora talvez seja a comissão de número 6, que trata de improbidade, leniência e legislação anticorrupção. Não é nenhuma surpresa que tenha surgido tanto interesse a respeito desse tema, porque, afinal, é de fato um complexo de matérias com as quais nós temos tido que lidar muito intensamente nesses últimos anos no Brasil. Percebemos, nas reuniões preparatórias e na remessa de proposições até agora, que todas as comissões têm gerado muito interesse, porque todas elas lidam com coisas muito práticas que estão nos livros de direito administrativo e nos tribunais o tempo todo.
Em sua opinião, há algum tema que merece maior discussão?
Guimarães Pereira – Não há nenhum tema desses que gere ou mereça maior destaque. Quando nós estruturamos a jornada nesses seis temas e grupos, tentamos apanhar tudo que havia de importante no direito administrativo brasileiro, desde os temas mais clássicos – que são aqueles fundamentais para a compreensão do direito administrativo e para a aplicação segura das regras – até os mais modernos, como arbitragem, anticorrupção e leniência.
Diferentemente de um congresso – em que as pessoas vão passivamente assistir às palestras –, a jornada é uma reunião de pessoas interessadas e especializadas nos temas para discutir propostas e produzir, por meio de um processo intenso de discussão e votação, enunciados que reflitam o consenso da doutrina.
A jornada só faz sentido a partir do interesse manifestado pela sociedade e pela comunidade jurídica de produzir essa discussão, mas é importante que os interessados no direito administrativo se deem conta de que não há como, em abril, no dia da jornada ou poucos dias antes do evento, inscrever-se para participar e assistir aos debates. Não existe isso.
A participação na jornada pressupõe a formulação de propostas de enunciados que vão estar sujeitas a esse debate. Sem ter sido convidado como especialista na matéria ou sem ter apresentado uma proposta para discussão, o eventual interessado não vai ter como participar, porque não há inscrições livres para o público.
Pretende-se que os interessados em participar da jornada remetam ao CJF as suas propostas de temas para discussão, na forma de um enunciado, uma proposta de interpretação. E essas propostas devem ser enviadas para que a jornada tenha matéria-prima para a discussão. Os doutrinadores todos que vão se reunir, eles próprios podem enviar propostas para discussão. Todas elas serão anônimas.
O que é necessário para obter um enunciado de qualidade?
Guimarães Pereira – O enunciado deve ser bem objetivo. O proponente deve encontrar um tema que mereça a atenção da doutrina e formular uma interpretação a respeito da norma que disciplina esse assunto, em um texto curto e objetivo.
Basicamente, se esse texto for curto e objetivo, direto ao ponto, e propuser uma interpretação a respeito do direito vigente, no sentido que for, ele vai ser um enunciado útil.
Os enunciados são admitidos para discussão na medida em que cumpram esses requisitos: sejam objetivos e tratem do direito vigente – não tratem, portanto, de propostas legislativas ou de direito já não mais vigente, a não ser que ele tenha, por qualquer razão, alguma aplicabilidade ainda. Portanto, que sejam temas que estão aptos à discussão. Se os coordenadores concordam ou não com a proposição, isso é irrelevante. Vai caber ao conjunto dos doutrinadores da jornada discutir o tema, votar a proposição e aprová-la – ou não.
Fonte: STJ
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