Com o tema ‘Contribuições de Luiz Gama para o Direito Brasileiro’, teve início ontem (20) o curso Direito e questão racial da Escola Paulista da Magistratura (EPM), coordenado pelas juízas Camila de Jesus Mello Gonçalves e Flávia Martins de Carvalho. A aula inaugural foi ministrada pela professora Lígia Fonseca Ferreira. A gravação da aula em breve será disponibilizada no canal da EPM no YouTube.
A abertura dos trabalhos foi feita pelo diretor da EPM, desembargador Luis Francisco Aguilar Cortez, que agradeceu a participação de todos e o trabalho das coordenadoras do curso. Ele lembrou que os conflitos surgem de desajustes na sociedade e que é preciso conhecer as causas e enfrentá-las. “Nas nossas raízes históricas, uma das fontes dos nossos desajustes sem dúvida tem relação com a questão racial, que tem de ser estudada e superada para encontrarmos o bem comum. Com esse curso certamente poderemos nos tornar melhores juízes e melhores pessoas”, ponderou.
A juíza Flávia Carvalho, diretora de Promoção da Igualdade Racial da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e integrante do grupo de trabalho criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para propor políticas judiciárias de combate ao racismo institucional no Poder Judiciário, agradeceu a participação de todos e o apoio da direção da Escola. “O quanto é simbólico e representativo estar aqui no Dia Nacional da Consciência Negra e fazer um resgate histórico sobre Luiz Gama, que teve uma trajetória tão importante para o Estado e para o País. O Judiciário também tem esse papel de promover o debate e buscar alternativas para o desenvolvimento de uma sociedade mais igualitária também do ponto de vista racial”, salientou.
Lígia Ferreira iniciou a exposição lembrando que a data comemorativa do Dia da Consciência Negra foi idealizada pelo poeta e professor Oliveira Silveira e corresponde ao dia da morte de Zumbi dos Palmares em 1695. Autora da obra Lições de Resistência, ela discorreu sobre a trajetória de Luiz Gama (1830 – 1882), considerado o primeiro abolicionista. Ela ressaltou que Luiz Gama foi um dos mais notáveis intelectuais negros e ativistas do século XIX e que sua história poderia ser considerada um patrimônio, não apenas do Brasil, conquanto não seja estudada nos bancos escolares. “Ele foi um defensor dos escravizados e do Direito e um grande intérprete do Brasil”, frisou, acrescentando que ele também foi jornalista, teve importante produção literária e que reconhecimentos póstumos e leis, em 2018, o declaram herói e patrono da abolição da escravidão.
A professora ressaltou o pioneirismo de Luiz Gama: foi o único intelectual e ativista negro do século XIX autodidata; o único a ter vivido a escravidão (por oito anos), embora nascido livre; escreveu sátiras políticas, sociais e raciais; lutou pelo abolicionismo, pelo fim da monarquia e instauração da república e pelos direitos humanos; foi o primeiro abolicionista negro a criar estratégias infalíveis para libertar “pessoas ilegalmente escravizadas”, como ele denominava; atuou na educação e na imprensa; e, no campo do pensamento jurídico, introduziu a perspectiva fundada na sua vivência como negro ex-escravizado.
A palestrante citou ainda trecho por ele escrito: “[em 1868] saí para o foro e para a tribuna, onde ganho o pão para mim e para os meus, que são todos os pobres, todos os infelizes, e para os míseros escravos que, em número superior a 500, tenho arrancado às garras do crime.” E, diante de ameaças de morte que recebia, declarou nos jornais: “eu advogo de graça, por dedicação sincera à causa dos injustiçados. Não pretendo lucros. Não temo violências”. “Luiz Gama viveu sempre em busca da liberdade e do saber”, concluiu.
Participaram também do evento a desembargadora Luciana Almeida Prado Bresciani, conselheira da Escola, o juiz Carlos Alexandre Böttcher, entre outros magistrados, servidores e outro profissionais.
Fonte: TJSP
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