Para o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), a ratificação do acordo firmado entre o Mercosul e a União Europeia (UE), estabelecendo as bases para as relações políticas e econômicas entre os países-membros dos dois blocos comerciais, tem que ser precedida de amplo debate com a convocação da sociedade civil e dos movimentos sociais. A posição do IAB foi firmada na sessão ordinária virtual desta quarta-feira (28/7) com a aprovação dos pareceres elaborados pelos relatores Sergio Sant’Anna, presidente da Comissão de Direito Constitucional e vice-presidente da Comissão de Direito da Integração, e Fábio Böckmann Schneider, membro da Comissão de Direito Internacional. Os pareceres foram aprovados com 96% dos votos do plenário.
“A ratificação do acordo deve ser antecedida também de estudos sobre as possíveis consequências ambientais e sociais da união entre os dois blocos econômicos”, defendeu Sergio Sant’Anna. Ele afirmou ainda que, “ao mesmo tempo, é preciso discutir profundamente a consolidação desse acordo que é de grande importância para o País, pois criará uma das maiores zonas de livre comércio do planeta, reunindo os países-membros dos dois blocos econômicos que, juntos, representam aproximadamente 25% da economia mundial e um mercado consumidor de 780 milhões de pessoas”.
Fábio Böckmann Schneider também se manifestou favoravelmente à ratificação do acordo, mas recomendou precaução: “Não existe dúvida de que certa cautela acerca das ameaças que existem é necessária, contudo elas são setorizadas, enquanto as oportunidades são globais”. Ainda segundo ele, “o acordo pode minimizar os danos deletérios decorrentes da pandemia em relação ao baixo crescimento econômico registrado nesse período de confinamento social”.
Os dois pareceres serão enviados pela presidente nacional do IAB, Rita Cortez, aos presidentes da República, do Senado, da Câmara dos Deputados, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) e das Comissões de Relações Exteriores do Senado e da Câmara; aos ministros da Economia e das Relações Exteriores e ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB).
Mesmo ressaltando a relevância do acordo assinado em maio de 2019 pelos representantes dos blocos econômicos, Sergio Sant’Anna disse que a sua ratificação poderá intensificar a atividade do agronegócio na pauta de exportações brasileiras, o que exige, segundo ele, a elaboração de estudos em todos os níveis da cadeia econômica para a verificação de suas consequências ambientais. “É preciso avaliar se a expansão do agronegócio, como também da agropecuária, poderá implicar risco de maior degradação da floresta amazônica, ampliação do uso de agrotóxicos, diminuição da proteção à biodiversidade e desrespeito às terras indígenas e quilombolas, entre outros fatores”, alertou. Sergio Sant’Anna lembrou que “o Brasil é signatário de tratados e acordos internacionais destinados à promoção de políticas de preservação ambiental”, disse.
Fábio Böckmann Schneider criticou a “ausência de direção” no Brasil, em termos de relações internacionais: “O acordo supre em parte essa falta de direção, mas é claro que cabe aos governos e à sociedade adaptarem-se para colher os melhores frutos das oportunidades e minimizar os riscos de danos”. Para o advogado, o acordo comercial tem potencial para ampliar a capacidade de exportação do País para a UE. “Em 2018, o Brasil exportou mais de US$ 42 bilhões para a União Europeia, aproximadamente 18% do total exportado pelo País naquele ano”, destacou.
Resistência – Sergio Sant’Anna informou que parlamentares de alguns países-membros da União Europeia, pressionados por entidades da sociedade civil, têm defendido a rejeição à ratificação do acordo. Segundo o relator, a resistência parte da cogitação da hipótese de que a ratificação poderá contribuir para o aumento da emissão de gases estufa e do desflorestamento provocado por eventual aumento da demanda europeia por madeira, minérios e produtos agropecuários brasileiros, sem que haja qualquer previsão ou cláusula impeditiva de possíveis danos ambientais.
O advogado apontou outras preocupações manifestadas por representantes dos futuros parceiros internacionais: “Muitos parlamentares europeus consideram, também, que o acordo poderá gerar uma situação de concorrência desleal em favor dos produtos agropecuários brasileiros, cujos custos de produção são mais baixos do que os europeus, uma vez que as normas trabalhistas e sanitárias vigentes no Brasil são menos rígidas, o que exige do nosso país estudos também sobre os possíveis impactos sociais decorrentes dessa disputa comercial”.
Em seu parecer, Sergio Sant’Anna citou ainda a manifestação recente do coordenador da Frente Parlamentar Mista de Apoio aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, deputado federal Nilto Tatto (PT-SP), para quem o acordo entre o Mercosul e a UE deve ir além da questão comercial. O parlamentar ressaltou que é preciso reforçar o compromisso do Brasil com os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável previstos na Agenda 2030 da ONU. Entre eles estão a erradicação da pobreza, segurança alimentar e agricultura, saúde, educação, igualdade de gênero, água e saneamento, energia e crescimento econômico sustentável.
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