no , ,

Para que nossa história não seja mais escrita com sangue

Por João Vítor de Oliveira Silva e Nathalia Caroline Fagundes Silva

Em 21 de março de 1960, na África do Sul, milhares de pessoas negras se reuniram, pacificamente, para protestar contra a lei do passe – que proibia as pessoas negras de transitarem livremente -, do regime do apartheid. Durante o ato, houve grave repressão da força policial sul-africana, que levou a morte de 69 pessoas e o ferimento de 186, naquele que ficou conhecido como o “Massacre de Shaperville”.

 

Por ser um marco na luta contra a política segregacionista sul-africana, a data foi escolhida pela ONU como o “Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial”. 

 

Apesar da discriminação racial ser facilmente reconhecida quando há lei ou ação que discrimine abertamente pessoas negras, como foi o apartheid, é preciso ir além e reconhecer que direitos são negados diariamente para milhares de pessoas negras, que sofrem as consequências da falta de políticas públicas de saúde, educação, segurança pública e emprego.

 

Não é outro o cenário brasileiro, a análise do país pela perspectiva racial demonstra que ainda há muito que lutar para eliminar a Discriminação Racial.

 

É fundamental lembrar que o Brasil se estruturou enquanto Estado sob, aproximadamente, 350 anos de escravização de pessoas negras, enquanto temos pouco mais de 130 anos da Lei Áurea, que não produziu soluções estruturais para a ferida da escravização. Como ensina o Professor Silvio de Almeida, “países como Brasil, África do Sul e Estados Unidos, não são o que são apesar do racismo, mas são o que são graças ao racismo.”[1].

 

Nesse sentido, em recente estudo divulgado pelo IPEA[2], chegou-se à conclusão que a desigualdade de renda racial se manteve intocada nas últimas décadas. E no mesmo sentido, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou estudo em 2021[3], no qual se constatou que independentemente do grau de instrução, o valor recebido por hora trabalhada da população branca era sempre superior à de pessoas negras, especialmente no ensino superior.

 

Portanto é primordial que o debate sobre o racismo estrutural se paute, também, em critérios econômicos e sociais, tendo em vista que recorrentemente as lutas contra a discriminação racial, seja em empresas ou na definição de políticas públicas, são distorcidos para não considerar esses fatores.

 

Além disso, infelizmente, no tocante aos índices de violência, as pessoas negras seguem sendo as maiores vítimas: no Anuário de Segurança Pública (2021), 76,2% das vítimas de morte violenta intencional eram negras, nos números de letalidade policial, 78,9% das pessoas mortas eram negras e nos casos de feminicídio 61,8% das mulheres mortas, também eram negras.

 

Sendo assim, o racismo não só permeia a sociedade brasileira, mas a estrutura econômica, cultural e politicamente, refletindo nos índices de violência, desigualdade social e desemprego.

 

Para mudar esse cenário, é fundamental a ação de instituições organizadas, como a OAB SP, que se comprometeu a instruir as lideranças no antirracismo, estabelecer cotas de 30% para os diversos órgãos da Ordem, a fortalecer políticas de ingresso e de manutenção de pessoas negras na advocacia paulista e trabalhar para manutenção das cotas raciais no âmbito federal e na implementação pelo governo do Estado de São Paulo. 

 

Por isso, para que nossa história não seja mais escrita com sangue, é fundamental que as instituições se unam à luta antirracista dos movimentos organizados, para propor e realizar medidas efetivas no combate à discriminação racial, fazendo com que o símbolo da luta do dia 21 de março torne-se em transformação social. 

 

João Vítor de Oliveira Silva e Nathalia Caroline Fagundes Silva são membros da Comissão Permanente de Igualdade Racial da OAB SP

  

[1] ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo Estrutural – São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019. Pg. 181.

[2]“A Desigualdade Racial no Brasil nas Três Últimas Décadas”. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/TDs/210611_td_2657.pdf. Acessado em: 18 de março de 2022.

[3] Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira. Disponível em:

https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101892.pdf.

Acessado em: 18 de março de 2022.

Sobre a OAB SP

Fundada em 22 de janeiro de 1932, a OAB SP é a maior Secional do Brasil, com mais de 450 mil profissionais inscritos, quase 5 mil estagiários e 33 mil sociedades inscritas. Mantém 120 comissões atuantes, entre permanentes e especiais, que desenvolvem trabalhos de estudo e aperfeiçoamento da legislação, além de zelar pela Advocacia paulista e pelos cidadãos. São 915 postos de atendimento espalhados por todo o Estado, incluindo a Secional e as 253 Subseções, e 241 pontos de Certificação Digital. A entidade promove, com exclusividade, a representação, defesa, seleção e disciplina da Advocacia. Ao defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, os direitos humanos e a justiça social, contribui com a consolidação das instituições democráticas e da cidadania brasileira.

Escrito por Redação

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Carregamento

0

Comentarios

0 comentarios

Ministra Maria Elizabeth Rocha, do STM, critica machismo no Judiciário

Decisão desobriga afastamento de gestantes do trabalho presencial durante a pandemia. Veja novas regras