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130 anos de história: Plenário do STF foi cenário de grandes julgamentos

A partir da Constituição de 1988, a Corte se abriu para a sociedade e para a diversidade.

Ao longo de seus 130 anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) acolheu as mais diversas representações sociais em suas dependências e seus julgados. Mas foi a partir da promulgação da atual Constituição Federal de 1988, também chamada de Constituição Cidadã, que o Tribunal se aproximou mais da sociedade. Iniciativas como as audiências públicas para debater com diversos setores sociais temas em julgamento na Corte e a participação dos terceiros interessados em processos de grande repercussão, na condição de amici curiae, contribuíram para esse processo.

Diversidade

Nessa evolução democrática, o Plenário do STF foi cenário de julgamentos memoráveis que levaram a Corte a flexibilizar protocolos em respeito à diversidade cultural e à defesa das minorias. Assim foi no julgamento da demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol (Pet 3388), quando dezenas de indígenas, em trajes típicos e descalços, tiveram assento no Plenário.

Os representantes das comunidades remanescentes dos quilombos também marcaram presença no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3239, ajuizada em defesa da garantia da titularidade de suas terras. Outro julgamento que também representou toda a diversidade cultural e religiosa do Brasil foi o que discutiu a constitucionalidade do sacrifício de animais em ritos religiosos, muito comuns em religiões de matriz africana. No julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 494601, o Plenário validou a Lei estadual 12.131/2004 do Rio Grande do Sul, que permite a prática religiosa.

Também encontraram espaço na Corte os transsexuais e os transgêneros, que comemoraram a decisão do STF no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 670422, que lhes garantiu o direito de alterar o registro civil sem a necessidade de cirurgia para mudança de sexo. Outro julgamento bastante aguardado foi o que permitiu a equiparação da transfobia e da homofobia ao crime de racismo, até que o Congresso Nacional edite lei que criminalize esses atos. Os processos, julgados em junho de 2019,  foram a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26) e o Mandado de Injunção (MI 4733).

O STF abriu espaço, em 2008, para discutir a liberação de pesquisas com células-tronco embrionárias, no julgamento da ADI 3510, contra a Lei de Biossegurança . Pesquisadores, comunidade médica e representantes de pessoas com deficiência ou que sofreram paralisia cerebral comemoraram, no Plenário, a validação da lei que permite as pesquisas. Em 2012, a análise foi sobre o direito de a gestante de feto anencéfalo (sem cérebro) poder interromper a gravidez, caso seja de sua vontade. A Corte julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54 e dispensou a autorização judicial para o procedimento.

Algumas crianças acompanhadas de seus pais também estiveram no plenário do STF para acompanhar o julgamento do RE 888815, em que se discutia o direito de os pais poderem educar seus filhos em casa, o chamado homeschooling ou ensino domiciliar. O colegiado entendeu, por maioria, que não há lei que ampare esse direito.

Julgamentos históricos

Em seu livro “A Judicialização da Vida e o Papel do Supremo Tribunal Federal”, o ministro Luís Roberto Barroso elencou 12 julgamentos do STF que considera históricos nos últimos 15 anos. Entre eles estão a proibição do nepotismo nos Três Poderes, em 2006 (ADC 12) e 2008 (RE 579951); a constitucionalidade da lei que autorizou pesquisas com células-tronco embrionárias (ADI 3510); a incompatibilidade entre a Lei de Imprensa do regime militar e a Constituição de 1988 (ADPF 130); a equiparação das uniões homoafetivas às uniões estáveis heteroafetivas (ADPF 132 e ADI 4277); o rito do procedimento de impeachment de presidente (ADPF 378); o afastamento de parlamentar do mandato de deputado federal e da Presidência da Câmara dos Deputados (AC 4070); e a possibilidade de execução da condenação penal após o julgamento em segundo grau (HC 126292, ADCs 43 e 44 e ARE 964246).

Maior julgamento

O maior julgamento da história do STF, até hoje, foi o da Ação Penal 470, em 2012, que apurou denúncia de corrupção envolvendo compra de votos e pagamento de propina, no escândalo conhecido como “Mensalão”, com 38 réus e mais de 72 mil páginas. Foram 53 sessões plenárias para o julgamento da ação, relatada pelo ministro Joaquim Barbosa (aposentado). Somente o acórdão tinha mais de oito mil páginas. Barbosa observou que, nos 11 anos em que compôs o STF, a Corte “tomou para si” a liderança nas transformações sociais que define como uma “revolução silenciosa”, por meio de decisões “corajosas, progressistas e, muitas vezes, contramajoritárias”.

Muito antes do mensalão, porém, o Supremo teve muitos julgamentos notórios. No Habeas Corpus (HC) 3536, impetrado em 1914, o jurista e senador Ruy Barbosa questionou a censura policial à publicação de um discurso no jornal O Imparcial em que criticava a decisão do governo Hermes da Fonseca de prorrogar o estado de sítio por mais seis meses. A extradição para a Alemanha da ativista Olga Benário, mulher de Luís Carlos Prestes, durante o regime de Getúlio Vargas também consta na lista de julgamentos históricos.

Pandemia

No presente, um dos pontos mais relevantes da atuação do STF é o julgamento de causas referentes à pandemia da Covid-19. Em pronunciamento ao Plenário, quando completou-se um ano do estado de pandemia reconhecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o presidente do STF, ministro Luiz Fux, lembrou o esforço da Corte na manutenção de suas atividades jurisdicionais.

A Corte priorizou os julgamentos individuais e colegiados de mais de 7 mil processos relacionados ao tema, como os referentes a medidas sanitárias, federalismo, questões econômicas e impactos sociais. Um dos julgamentos mais destacados é o que reforçou a competência da União, dos estados e dos municípios para a adoção de medidas sanitárias e de contenção à Covid-19, de forma a minimizar os impactos econômicos e sociais da doença.

O Tribunal discutiu, também, a obrigatoriedade da vacinação contra o coronavírus. O tema vacinação não é novidade na Suprema Corte. Em 1905, julgou processo relacionado à chamada Revolta da Vacina, contra a vacinação compulsória da população para o combate à epidemia de varíola. No julgamento do HC 2244, o Tribunal, por maioria, impediu que as autoridades entrassem na residência de um cidadão para vaciná-lo compulsoriamente, ressaltando a inviolabilidade do domicílio, nos termos da Constituição Federal de 1891.

Em relação à Covid-19, o STF decidiu  que os estados podem estabelecer a compulsoriedade da vacinação e impor medidas restritivas ao cidadão que se recusar a se imunizar. Nesse caso, o entendimento foi que, em situações excepcionais, o direito à saúde coletiva deve prevalecer sobre os direitos individuais. Entretanto, o Tribunal ressaltou que nenhum cidadão poderá ser levado à força para vacinação (ADIs 6586 e 6587 e ARE 1267879). Na ADPF 770, o STF autorizou os estados e o Distrito Federal a importarem vacinas e adotarem seus planos de imunização.

Outros julgamentos históricos do STF também podem ser encontrados no site comemorativo dos 130 anos do STF na República, em julgados relevantes. 

Interesse internacional

Ao longo de sua história, a Suprema Corte brasileira também julgou milhares de casos envolvendo estrangeiros, na maioria deles pedidos de habeas corpus e extradições. Muitos casos tiveram destaque internacional.

Em 1967, o STF julgou em conjunto pedido de extradição e habeas corpus envolvendo Franz Paul Stangl (Ext 274 e HC 44074), servidor da Polícia Judiciária alemã e integrante do Partido Nazista, acusado pelo extermínio de milhares de pessoas em campos de concentração, durante a Segunda Guerra Mundial.

Ao governo italiano, o STF concedeu, em 1984, a extradição a Tommaso Buscetta, que havia denunciado a máfia siciliana em colaboração com a Justiça de seu país (Ext 415). No entanto, negou o pedido quanto a Luciano Pessina (Ext 694), condenado na Itália por supostos atos de terrorismo. O ex-militante foi considerado perseguido político, e sua extradição foi rejeitada por unanimidade, pois a Constituição brasileira impede a extradição por motivação política. Em novembro de 1997, o Plenário negou seguimento ao pedido da Grã-Bretanha para a extradição de Ronald Biggs (Ext 721), que participou do assalto ao trem pagador em Londres, em 1963.

Outro caso emblemático e notório envolvendo Brasil e Itália em pedido de extradição é o de Cesare Battisti (Ext 1085). Julgado em 2009, o pedido do governo italiano para a entrega do ex-ativista, condenado em seu país por quatro homicídios no final da década de 1970, foi deferido pelo STF, sendo a entrega ato discricionário do presidente da República.

América Latina

No início dos anos 2000, o Plenário do STF julgou outra extradição de grande repercussão na América Latina: a do ex-chefe das Forças Armadas paraguaias Lino Oviedo (Ext 794). Ele era acusado em seu país de envolvimento no assassinado Luiz Maria Argaña, vice-presidente do Paraguai à época. Nesse caso, o Plenário negou o pedido, por avaliar que se trataria de uma “extradição política disfarçada”.

Em maio de 2011 foi concedida a extradição do major do exército argentino Norberto Raul Tozzo, acusado em seu país por suposta participação na morte de 22 manifestantes contra o governo militar na Argentina, no episódio conhecido como “Massacre de Margarita Belén”. A decisão, tomada na Extradição 1150, foi por maioria de votos. E, há 13 anos, o Plenário autorizou, por unanimidade, a entrega, ao governo dos Estados Unidos (Ext 1103), do colombiano Juan Carlos Ramirez Abadia, considerado pela Polícia Federal um dos maiores traficantes de drogas do mundo

Brasileira naturalizada

Outro caso que envolveu a Justiça do Brasil e a dos EUA foi o pedido de extradição da brasileira naturalizada americana Cláudia Cristina Sobral. Ela foi acusada de ter assassinado o marido norte-americano no estado de Ohio, em 2007. Embora a Constituição brasileira impeça a extradição de cidadão nacional para outro país, a Primeira Turma do STF, ao julgar a Ext 1462, em março de 2017, concluiu que, ao se naturalizar norte-americana, ela renunciou à nacionalidade brasileira, afastando o impedimento à extradição.

Alguns dos julgamentos históricos mais antigos do Tribunal podem ser encontrados aqui.

Fonte: STF

Escrito por Redação

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