O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quarta-feira (8) – no âmbito da ADPF 709 – que o governo federal adote uma série de medidas para conter o contágio e a mortalidade por Covid-19 entre a população indígena.
Entre essas medidas estão: planejamento com a participação das comunidades, ações para contenção de invasores em reservas e criação de barreiras sanitárias no caso de indígenas em isolamento (aqueles que por escolha própria decidiram não ter contato com a sociedade) ou contato recente (aqueles que têm baixa compreensão do idioma e costumes), acesso de todos os indígenas ao Subsistema Indígena de Saúde e elaboração de plano para enfrentamento e monitoramento da Covid-19.
A decisão foi tomada na ação apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e seis partidos políticos (PSB, PSOL, PCdoB, Rede, PT, PDT), em que se apontou omissão do governo federal no combate à Covid-19 entre os indígenas.
Barroso informou que procurou atuar, no caso, como “facilitador de decisões e de medidas que idealmente devem envolver diálogos com o poder público e com os povos indígenas, sem se descuidar, contudo, dos princípios da precaução e da prevenção”.
Detalhamento das medidas
O ministro determinou:
1. SALA DE SITUAÇÃO: Que o governo federal instale Sala de Situação para gestão de ações de combate à pandemia quanto a povos indígenas em isolamento ou de contato recente, com participação das comunidades, por meio da APIB, da Procuradoria-Geral da República e da Defensoria Pública da União. Os membros deverão ser designados em 72 horas a partir da ciência da decisão, e a primeira reunião virtual deve ser convocada em 72 horas depois da indicação dos representantes;
2. BARREIRAS SANITÁRIAS: Que em 10 dias, a partir da ciência da decisão, o governo federal ouça a Sala de Situação e apresente um plano de criação de barreiras sanitárias em terras indígenas;
3. PLANO DE ENFRENTAMENTO DA COVID-19: Que o governo federal elabore em 30 dias, a partir da ciência da decisão, com a participação das comunidades e do Conselho Nacional de Direitos Humanos, um Plano de Enfrentamento da Covid-19 para os Povos Indígenas Brasileiros. Os representantes das comunidades devem ser definidos em 72 horas a partir da ciência da decisão;
4. CONTENÇÃO DE INVASORES: Que o governo federal inclua no Plano de Enfrentamento e Monitoramento da Covid-19 para os Povos Indígenas medida de contenção e isolamento de invasores em relação a terras indígenas. Destacou, ainda, que é dever do governo federal elaborar um plano de desintrusão e que se nada for feito, voltará ao tema.
5. SUBSISTEMA INDÍGENA: Que todos os indígenas em aldeias tenham acesso ao Subsistema Indígena de Saúde, independente da homologação das terras ou reservas; e que os não aldeados também acessem o subsistema na falta de disponibilidade do SUS geral.
Fundamentos
Na decisão, o ministro frisou que os índios, por razões históricas, culturais e sociais, são mais vulneráveis a doenças infectocontagiosas, apresentando taxa de mortalidade superior à média nacional. Há indícios de expansão acelerada do contágio da Covid-19 entre seus membros e alegação de insuficiência das ações promovidas pela União para sua contenção.
Esclareceu, ainda, que indígenas em situação de isolamento ou contato recente estão mais expostos e devem ser protegidos, com confinamento das áreas.
Ele completou ainda que a criação da Sala de Situação sobre indígenas está prevista em portaria do Ministério da Saúde e da Funai, não representando, portanto, interferência no Executivo. “Não há que se falar em interferência do Judiciário sobre Políticas Públicas, mas, sim, em mera implementação judicial de norma federal que não está sendo observada pelo Poder Executivo.“ O ministro disse também que a participação dos índios no processo é “indispensável” porque cada comunidade tem problemas específicos que precisam ser levados ao conhecimento dos governantes.
A decisão registrou, ainda, o papel destacado das Forças Armadas na distribuição de suprimentos e materiais de saúde a diversas comunidades indígenas, bem como sua atuação, em parceria com o Ministério da Saúde, na atenção médica a tais povos.
Sobre a invasão de terras, o ministro completou que a situação não tem relação direta com a pandemia, mas que os autores da ação falam em 20 mil invasores em apenas uma das áreas. A remoção envolveria risco de conflito armado, além da necessidade do ingresso de forças policiais e militares nas diferentes áreas, aumentando o risco de contágio.
Para Barroso, “a União deve se organizar para enfrentar o problema, que só faz crescer”. Não se trata de uma medida que possa ser tomada “por simples ato de vontade, com caneta e tinta”.
O ministro destacou ser “inaceitável” a falta de prestação de saúde por meio do Subsistema Indígena de Saúde para povos aldeados em terras não homologadas. “A identidade de um grupo como povo indígena é, em primeiro lugar, uma questão sujeita ao autorreconhecimento pelos membros do próprio grupo. Ela não depende da homologação do direito à terra.”
Por fim, o ministro citou a existência do Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo Novo Coronavírus em Povos Indígenas, mas frisou que se trata de plano “vago “e “expressa meras orientações gerais e não prevê medidas concretas, cronograma ou definição de responsabilidades”. Além disso, o plano não contou com a participação de comunidades indígenas.
Leia a íntegra da decisão.
Fonte: STF – Supremo Tribunal Federal
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