O Instituto Brasileiro das Organizações Sociais de Saúde (Ibross) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6552) no Supremo Tribunal Federal para questionar a Portaria 2.282, editada pelo Ministério da Saúde no último dia 27/8, que introduziu novas regras para a realização de nas unidades do Sistema Único de Saúde (SUS). A ADI foi distribuída ao ministro Ricardo Lewandowski.
A portaria exige que, em casos em que houver indícios ou confirmação do crime de estupro, o médico responsável pelo procedimento acione a polícia, preservando possíveis evidências materiais do crime. Para o procedimento de justificação e autorização da interrupção da gravidez em caso de estupro, a mulher deverá fazer um relato sobre a violência sofrida, com informações sobre local, dia e hora do fato, descrição do agressor e indicação de testemunhas, quando houver. Depois disso, será submetida a exame físico, que incluirá ultrassonografia para visualização do embrião ou feto, se a gestante desejar. A equipe de saúde responsável pelo procedimento deverá ser integrada por obstetra, anestesista, enfermeiro, assistente social e/ou psicólogo.
Criminalização da vítima
Na ação, o Ibross argumenta que a norma transfere ao médico e aos demais profissionais das instituições de saúde atividade policial e de investigação que extrapola o atendimento assistencial à saúde por meio do SUS. Sob o aspecto legal, moral e humanitário, o instituto afirma que a portaria constrange e causa sofrimento à vítima, como forma de demovê-la da interrupção da gravidez.
Segundo a entidade, a portaria demonstra o uso político e ideológico do Estado para dificultar o aborto legal, e não é mera coincidência o fato de ter sido editada após o dramático caso do aborto realizado em uma menor de 10 anos em Recife (PE), estuprada desde os seis anos pelo tio. Nesse caso, segundo a entidade, o Estado não apenas criou inúmeros obstáculos ao aborto previsto em lei como deixou de garantir o sigilo de informações dos dados da menor e do local onde o procedimento seria realizado. De acordo com a argumentação, a norma confronta preceitos constitucionais pétreos e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e simboliza “não apenas o retrocesso nas políticas de proteção à mulher, à criança e ao adolescente como às demais vítimas de violência sexual, que cresce exponencialmente num país que sinaliza para a criminalização da vítima, e não do agressor”.
Para o Ibross, o oferecimento de exame de ultrassom para visualização do feto prolonga o sofrimento da vítima e a transforma em criminosa. A exigência de que ela detalhe a violência sofrida é outra forma de fazê-la reviver seu drama. Outro problema, segundo o instituto, é que percentual considerável dos procedimentos de aborto legal ocorrem de forma medicamentosa e, portanto, não necessitam de médico anestesista para sua realização, de maneira que a obrigatoriedade desse profissional na equipe é mais uma forma de dificultar o procedimento.
O Ibross pede liminar para suspender a eficácia da portaria ministerial, com o argumento de que centenas de mulheres, crianças e adolescentes deixarão de procurar assistência médica em razão dos obstáculos que a norma introduziu. Argumenta, ainda, que as unidades públicas de saúde de todo o país e seus profissionais não têm qualquer estrutura e função de estado-policial, pois sua função é acolher a vítima e garantir sua proteção e sua saúde física e mental.
Fonte: STF
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